quarta-feira, 28 de outubro de 2009

Pato laqueado de Beijing

Tenho até hoje guardada a edição extra de Veja que circulou quando o Collor foi deposto: a capa é o Collor de frente, cabeça gomalinada baixa e a manchete em letras vermelhas e garrafais: CAIU!
O melhor texto daquela edição é de Roberto Pompeu de Toledo, tirando sarro de todas as bravatas e gabolices do ex-presidente, como pilotar uma ferrari e reclamar que ela estava "puxando para a esquerda" para o piloto de testes da fábrica, posar de fotógrafo de flores do cerrado, pular de blindados do exército totalmente fardado (a la Jobim), entre outros episódios pitorescos. Jamais pensei que fosse dizer isso, mas que saudade daquela época: porque eu era mais novo, ainda não embrutecido pela vida, claro, mas porque projetos malucos de poder de gente obcecada duravam pouco.

Talvez porque não fossem tão bem elaborados.

No texto de Pompeu é narrado o episódio, que já ficou famoso, do malsinado brinde feito em Pequim, em volta de um pato laqueado, pelos futuros artífices da "Repúlica de Alagoas" - Renan Calheiros, o próprio Collor, se não me engano o "regenerado" Cláudio Humberto e outros. O texo situa o ocorrido como uma espécie de pedra fundamental do malogrado projeto de poder de Collor e seus acólitos - talvez não tão malogrado assim, talvez não malogrado at all.

Lembrei disso lendo as repercussões da mesada que Lula ganhou por ser "perseguido político", porque lendo isso lembrei de ter lido em algum lugar a história sobre, em algum bar de São Bernardo do Campo, a estrela do PT ter sido desenhada por algum acólito de Lula em um guardanapo.

Provavelmente houve algum brinde - talvez não "ao futuro presidente da república", mas algo parecido, quem sabe até "à futura nova classe" que eles pretendiam implantar, não com essas palavras, mas com essa intenção. Foi um projeto de poder muito mais bem engendrado e profissional. Podiam até estar bêbados, mas tinham muito mais determinação que o grupo reunido em Pequim - ali, creio que foi mais uma bravata que acabou funcionando do que qualquer outra coisa. O esquema que derrubou Collor foi típico de arrivistas baratos, não se sustentava - ele não conseguiu completar o mandato. Lula ruma para o terceiro.

Perdeu diversas eleições, mas nunca desistiu. A persistência e a paciência fazem lembrar o resoluto Hitler do putsch - o cabo bávaro, afinal, foi eleito.

Nunca antes na história deste país um projeto de poder foi tão arraigadamente implantado. Lula é a maior unanimidade da história do Brasil. Getúlio foi responsabilizado por um assassinato e o clima ficou insustentável - e ele saiu da vida para entrar na história. Há 7 cadáveres ligados às maquinações da eleição de Lula, e sua popularidade só cresce.

Collor, alguns gostam de dizer, caiu por causa de uma Elba - um mensalão, uma venda da varig, um mst arregado e tantas outras putarias franciscanas depois, e a popularidade do Lula só cresce.

Muitos se preocupam em entender e explicar esse fenômeno: o "presidente teflon", o "presidente pobre" que vingou todos os miseráveis ao se apossar da máquina e da chave do cofre, e a agir como um Robin Hood simbólico: ele rouba apenas para ele e seus "compadres", mas é como se roubasse para todos os pobres, fazendo justiça a "500 anos" de qualquer coisa. E coroa tudo com o perdão a todas as roubalheiras flagradas cabalmente: "pobre quando come melado se lambuza".

O pato laqueado de Collor e o guardanapo de boteco de Lula são dois marcos simbólicos, talvez, da mesma coisa. Como o nazismo serviu de precursor do comunismo, talvez o pato laqueado tenha servido para abrir caminho para os novos níveis de esculhambação e estupro da nação que vemos hoje. Não há uma área sequer da atuação estatal que não esteja contaminada por esculhambação oceânica, o que é salvaguardado, basicamente, por dois "argumentos": PAC/Bolsa Família/Social e "isso sempre foi assim". A diferença é o apego dessa gente à teta. Antes, parecia haver uma noção de finitude e certos pruridos. Hoje, não há mais prurido nenhum. Pelo contrário.

O achaque público dos fabricantes de aviões de caça é um bom exemplo da loucuragem que se instalou. Adhemar de Barros era de fato um amador. O que se vê hoje é uma mistura do "rouba, mas faz" com o "estupra, mas não mata" e a ética sindical.

Não é nenhum segredo: petistas, comunistas, socialistas e associados não são diferentes de outros postulantes inescrupulosos ao poder. A grande vantagem competitivas deles é a perfeita cortina de fumaça da qual dispõe: salvar os pobres, dividir as riquezas, "o social". E isso é o salvo-conduto para a estalinização geral. Até expurgos estalinistas tivemos - até que alguém explique o que aconteceu no caso Celso Daniel, é exatamente o que parece. A sindicalização do estado é outro problema: foram desmontados alguns dos poucos órgãos estatais que funcionavam bem e eram estritamente técnicos e funcionavam com base em uma idéia de excelência: o Itamaraty, o IPEA e outros. Viraram grandes sindicatos. Nunca fomos a melhor das meritocracias, mas a noção ainda não estava perdida. Perdeu-se.

No museu da república, daqui a muitos anos, o pato laqueado estará ao lado do guardanapo de boteco com o símbolo do PT, em uma vitrine sobre o "quarto reich" brasileiro e a sovietização não tão dissimulada do país.

2 comentários:

Diogo F disse...

Melhor texto que eu li este ano, meu velho. E não foram poucos...

No mais, chegaste a ver isto aqui? http://veja.abril.com.br/blog/augusto-nunes/direto-ao-ponto/a-confissao-de-lula-desmonta-o-palavrorio-complicado-do-doutor/

@willard_captain disse...

Valeu! Foi justamente lendo esse aí que eu lembrei. Esse cara manda bem demais.